Texto publicado na Obvious em 2 de novembro de 2013.
Edgar Allan Poe é sabidamente um ícone das histórias de terror e mistério.
Seu legado é de grandeza imensurável. Mas, talvez, a sua maior
influência esteja nas narrativas policiais. Seu protagonista, o
excêntrico chevalier C. Auguste Dupin serviu de base para a
criação de inúmeros detetives. Arthur Conan Doyle concebeu Sherlock
Holmes. Agatha Christie criou Hercule Poirot. Todos eles peculiares
cavalheiros que resolvem enigmas por meio de investigações cerebrais, ao
contrário do que ocorre no romance policial estadunidense, em que o
personagem principal soluciona seus enigmas por meio da violência e do
acaso, como Sam Spade e Philip Marlowe.
"Assassinatos na Rua Morgue" é o primeiro dos
contos da chamada trilogia Dupin. O narrador, um Dr. Watson sem nome,
para introduzir a trama a ser relatada, faz diversas comparações entre
tipos de jogadores. Ele opõe enxadristas e jogadores de dama: os
primeiros calculam, os últimos analisam. Alguns são inteligentes, outros
concentrados e ainda há a classe dos perspicazes. Mas, segundo ele, o
analista é o tipo de jogador mais atento, que nota variações externas e
internas. É aí que se enquadra Dupin, um intelectual amante da
escuridão, que lê, reflete e produz de maneira mais eficiente nas
trevas.
Neste conto, um misterioso crime, em que mãe e filha são brutalmente
assassinadas, é o quebra-cabeça a ser resolvido. O jornal apresenta
testemunhas que ouviram barulhos no interior do apartamento em que
ocorreram as mortes. Como eram de diferentes nacionalidades e não
conheciam o "idioma" falado pelo suposto assassino, cada um dá sua
opinião.
A força policial, como é recorrente nas narrativas criminais,
mostra-se perdida. Aos seus olhos, o caso se define como insolúvel. É
por isso que Dupin, um indivíduo de comportamento distraído e
personalidade vazia, entra no caso, já que enxerga além dos relatos
publicados pela imprensa local. Ele recorre a argumentação dialética e a
estudos teóricos na busca pela verdade, provando sua grande bagagem
intelectual. A descoberta do inimaginável assassino mostra o motivo pelo
qual C. Auguste Dupin é considerado um personagem imortal e digno de
inspiração para tantos escritores.
Anti-hérói. Sutil. Enigmático. Amoral. O chevalier de Edgar Allan Poe segue presente nas entrelinhas da ficção contemporânea.
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