segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Qualidade

Em todos os tipos de arte, nos dias atuais, há certa crise, segundo alguns críticos, de originalidade. Para ser um artista bem sucedido o sujeito tem que pintar e bordar (literalmente, às vezes) para ser bem aceito pela imprensa e público em geral. 

Com tantas coisas denominadas como clássicas que já foram publicadas, lançadas ou expostas, está cada vez mais difícil fazer algo tão impactante quanto aquilo que cativou no passado. 

Mas não acho que beber em fontes já utilizadas seja algo necessariamente ruim. Antes uma boa obra inspirada em vários artistas do que outra diferente, mas de gosto duvidoso. Dentro dos gêneros de cinema, histórias em quadrinhos e literatura que aprecio, considero mais aqueles autores que não escondem suas referências. 

O filmes noir da década de 50 e 60, inspirados na literatura policial de nomes como Raymond Chandler (foto), deixaram saudade. Então, não é necessário reinventar o gênero mesmo com todo o aparato tecnológico à disposição dos produtores. Ao contrário, os diretores podem utilizá-los a seu favor, mantendo o formato e dando uma fotografia diferente (mas não muito) dos originais. 

Um bom exemplo disso são os filmes Dália Negra e Sin City. O primeiro, dirigido por Brian De Palma, é inspirado na obra literária do americano James Ellroy. O diretor fez um belo trabalho, com uma fotografia inovadora, que remete ao aspecto sombrio peculiar do cinema noir

O segundo, dirigido pelo trio Robert Rodriguez, Frank Miller e Quentin Tarantino (diretor convidado), é uma adaptação das consagradas histórias em quadrinhos escritas e desenhadas pelo próprio Miller. Rodriguez, idealizador do projeto, manteve a estética peculiar da obra impressa, desenhada toda em preto e branco, utilizando-se apenas da cor vermelha, o que deu um aspecto visual de grande qualidade.

O mesmo Raymond Chandler mencionado acima é "descaradamente" citado e tem suas ideias utilizadas como base para a composição dos melhores contos e romances policiais de Rubem Fonseca. A prova do sucesso dessa fórmula é o advogado criminal Paulo Mandrake, protagonista dessas tramas, claramente inspirado no detetive particular igualmente durão, mulherengo e apaixonado por xadrez, Phillip Marlowe (reparem, caro leitor e estimada leitora, que as iniciais dos nomes são as mesmas). 

As histórias, ao invés de serem localizadas na clássica Los Angeles dos anos 40 e 50, ambientam-se na violenta cidade do Rio de Janeiro, com criminosos e femme fatales adaptados à contemporaneidade brutal da capital carioca. Ideias, no mínimo, bem sucedidas.

Como todo consumidor, desejo, sim, qualidade no que demanda tempo e dinheiro como forma de investimento. Mas isso não significa que, para me cativar, uma obra tenha que ser algo totalmente novo. Uma mistura de vários clássicos pode gerar um produto inédito, adaptado à atualidade e, acima de tudo, cativante.

Por essas e outras, qualidade está, indubitavelmente, acima da originalidade.

domingo, 19 de agosto de 2012

Vai encarar?

Durante boa parte de minha não tão longa vida, considerei o cinema pura e simplesmente como forma de diversão. Após meu ingresso na universidade, descobri uma outra faceta no ato de assistir a filmes, que remete à reflexão crítica e analítica dos longa-metragens. Cheguei a diretores que utilizaram e utilizam suas câmeras para literária ou explicitamente dizerem algo que faça o telespectador pensar. A maioria deles pertence ao velho continente, destoando da popular produção hollywoodiana. Nomes como Frederico Fellini, Werner Herzog, Ingmar Bergman, Wim Wenders, Fritz Lang, François Truffault e Jean-Luc Godard passaram a fazer parte da minha lista de filmes planejados.

Tudo bem, por mais que essa coisa meio "cult" pareça maçante, creio que tais produções sejam necessárias à nossa formação humana, para que possamos, através da ficção, compreender melhor o mundo em que vivemos. Mas a formação cinéfila de boa parte das pessoas (a maioria delas pertencentes ao sexo masculino) de minha geração possui bases nos bons e velhos filmes de ação, que nos faziam ficar acordados até tarde da noite (muitas vezes contra a vontade de nossos queridos pais) para chegar na manhã seguinte à escola, com olheiras enormes na cara, e comentar com os amigos sobre o filme que passara na Tela Quente (na época, muito mais criteriosa nas escolhas). Ficar de fora dos comentários era deveras frustrante e deprimente.

Atores como Arnold Schwarzenegger, Mel Gibson, Chuck Norris, Jean-Claude Van Damme, Bruce Willis e Sylvester Stallone eram considerados heróis por boa parte da molecada. Além de serem protagonistas de cenas de ação memoráveis, eram (e são) possuidores de um carisma inigualável. Franquias como Rambo, Braddock, O Exterminador do Futuro, O Grande Dragão Branco, Máquina Mortífera e Duro de Matar marcaram época e fazem os agora marmanjos ainda pararem em frente à TV para ver pela décima vez o Exterminador de Schwarzenegger dizer "Hasta la vista, baby"; ou o detetive Martin Riggs (Gibson) deslocar e colocar seu ombro de volta no lugar; ou Frank Dux (Van Damme) vencer Chong Li, mesmo estando temporariamente  desprovido de visão; ou quem sabe, ainda, conferir John McClane (Willis) correr sobre uma infinidade de cacos de vidro enquanto é vítima de uma chuva de balas.

Sem querer parecer tendencioso, mas já sendo, talvez um diretor que tenha conseguido misturar essa coisa mais pensada do cinema com a adrenalina dos filmes de ação seja Quentin Tarantino. Antes ou depois de qualquer "pega para capar", há diálogos muito "viajados", que enriquecem suas personagens  e aumentam a expectativa sobre o que acontecerá na cena seguinte. E, assumidamente, Tarantino utiliza como referência esses filmes mais antigos, muitas vezes considerados trash, costurando colchas de retalhos como Kill Bill, Pulp Fiction ou Cães de Aluguel, que viraram verdadeiras obras de arte.

E, como homenagem a todos esses heróis que entreteram a minha e muitas outras infâncias, será lançada, no próximo dia 31, a continuação da franquia dirigida por Sylvester Stallone, intitulada Os Mercenários. Boa parte dos agora senhores acima citados está presente no elenco desse filme que promete muito barulho, explosões à vontade, pouca conversa e pancadarias épicas. 

Vai encarar?

domingo, 12 de agosto de 2012

Um pesadelo

Na última segunda-feira, a TV Cultura exibiu, ao vivo, o programa Roda Viva no qual o entrevistado foi ninguém mais, ninguém menos que Jânio de Freitas. Para quem não sabe, trata-se de uma lenda viva do jornalismo brasileiro, que trabalhou em grandes jornais do país. Um dos seus mais notáveis feitos foi a reforma editorial do Jornal do Brasil, enquanto seu editor-chefe. Atualmente, mantém uma coluna no caderno Poder, da Folha de S. Paulo. Foi uma verdadeira aula de jornalismo, em que o entrevistado criticou diversas falhas da imprensa atual, como a falta de identidade de diversos jornais (seriam imitações do Jornal do Brasil), as "legendas para cegos" no próprio jornal onde trabalha (tratariam o leitor como um "bobão"), jornalistas que não lêem jornal e falou também sobre sua infelicidade por ter escolhido a profissão que exerce (gostaria de ter sido piloto). Mas o ponto que mais me chamou a atenção foi quando lhe foi indagado a respeito do futuro do jornal impresso.

Jânio analisou que em cada meio pelo qual o jornal é oferecido, seja ele impresso ou virtual, há um tipo de leitor. Hoje, nos jornais de papel, ao final de cada matéria, há a sugestão de que se leia mais sobre aquele assunto na página virtual do diário. Deverá o leitor então correr até o computador, ler o que lá está, abrir o jornal novamente, ler, acessar a internet de novo, num eterno e atordoador vai-e-vem de mídias? Segundo o jornalista, o leitor de um é completamente diferente do outro, sendo eles buscadores de assuntos e modos de se ler uma notícia distintos.

Desnecessário dizer que concordo com o que foi dito. Considero inimaginável um mundo sem jornais impressos. Foi por meio deles que foram publicados de maneira pioneira grandes clássicos da literatura universal. As crônicas e colunas analíticas são apresentadas e lidas de maneira mais eficiente no papel. Quando abro um jornal impresso e, acima de tudo, concreto, busco ler o que ali se apresenta calmamente, da maneira mais concentrada possível. Essa tranquilidade não é encontrada virtualmente, já que ali se apresentam, juntamente com o texto, um amontoado de novos links que remetem a acontecimentos de última hora. Quando me dou conta, há uma infinidade de janelas abertas, e nem uma coisa, nem outra, está sendo lida. É um verdadeiro caos informativo.

Não descarto a importância da página virtual. Sua utilidade se dá pela prontidão com que os acontecimentos são expostos e também para o leitor que busca ler algo de maneira rápida e sucinta. É importante a manutenção de colunistas e jornalistas virtuais, que se utilizem de uma linguagem própria para aquele meio. Um modo de escrita mais intenso e analítico é apropriado para a mídia de papel. Também não se pode negar a importância das redes sociais para a boa informação. Toda empresa de jornalismo obrigatoriamente possui uma ramificação no Facebook ou no Twitter, que ajudam a propagar novos e recentes furos.

Penso que, conforme Jânio mais ou menos explicitou, o jornal impresso não deve ser banido em prol da tecnologia. Ele deve, sim, adaptar-se aos novos tempos, assim como o jornalismo busca aprimorar-se de acordo com as exigências de um mundo cada vez mais veloz. Já se fala na extinção das bancas de jornais e revistas. Alguém aí quer que isso aconteça, e que o hábito de ir ao encontro do jornaleiro numa manhã de domingo, com a finalidade de adquirir seu exemplar mensal, semanal ou diário, seja perdido?

Eu, sinceramente, considero essa possibilidade não como um futuro, mas sim um pesadelo.   

domingo, 5 de agosto de 2012

A cachola e a pena que não descansam

Há alguns dias, descobri por meio da recomendação feita por minha comparsa poeta e blogueira Nalú Baptista (escreve regularmente no blog Janela Inteligível), o site oficial de Vinicius de Moraes. Para mim, o poetinha sempre foi sinônimo disso mesmo, de poesia. Porém, nesse espaço virtual, estão disponíveis textos que remetem à face cronista do escritor e compositor, que é tão maravilhosa quanto as outras já conhecidas.


Em um desses textos, Vinicius trata de um assunto do qual, de certa e indireta forma, já tratei aqui: a dificuldade que o cronista encontra para manter uma produção textual regular e inspirada. Disserta ele que, diferentemente do romancista, que já tem em mente sobre qual assunto escrverá, o cronista encontra-se muitas vezes em um beco sem saída repleto de indagações com relação a qual assunto escrever.

Qual pauta ou notícia seria merecedora de destaque? O escabroso sistema político em vigência? As eleições municipais, com candidatos desprovidos de qualidade, que se aproximam? O futebol brasileiro carente de times que encantem a seus torcedores? Algum filme assistido? Um livro que está sendo lido? Uma música que não sai da cabeça? Um acontecimento inútil no cotidiano do escritor?

As possibilidades dubitosas, de fato, são inúmeras. À elas juntam-se as dúvidas com relação à principal força de combustão do cronista, simbolizada pela figura do leitor. Por conta da correria cotidiana, muitos (e eu sou um deles) abrem um diário ou periódico apenas para apreciar uma ou duas crônicas, deixando as notícias de lado. Se o cronista não mais corresponder às expectativas criadas por seu receptor, este procurará em outros impressos uma forma de entretenimento intelectual rápido para o seu dia-a-dia.

O mesmo ocorre com os blogs. Há mais ou menos oito meses sinto na pele o árduo desafio de manter esse humilde espaço ativo. Dias infrutíferos como os de hoje, em que aquela ideia inspiradora, que me faz pegar a caneta e escrever de forma compulsiva e desenfreada, simplesmente não vem, são, deveras, desesperadores. Vazios criativos como esses me fazem questionar a mim próprio se realmente tenho o talento necessário para produzir bons textos, ou se eles não passam de frutos de algum lapso poético. Mas, quando olho para os quase cinquenta escritos aqui registrados, não posso deixar de sentir certo orgulho, pois em cada post há erros e acertos que foram corrigidos e melhorados, respectivamente, impulsionando-me a criar, nem sempre de forma competente, novas divagações.

E, é claro, por conta desse espaço pude conhecer outros escrevinhadores que, assim como eu, buscam manter a cachola sempre funcionando, como a Nalú, citada no início desse texto, e o já consagrado e imortalizado e igualmente aqui referenciado Vinícius de Moraes. É graças a esses e inúmeros outros artistas que não deixo descansar a pena.

Até o próximo domingo!