Texto publicado na Obvious em 14 de dezembro de 2013.
P. D. James, no livro Segredos do romance policial: história das histórias de detetive, coloca o chevalier
C. Auguste Dupin como o "primeiro investigador fictício a confiar
primordialmente na dedução a partir de fatos observáveis." O conto "O
mistério de Marie Rogêt" não deixa dúvidas a repeito disso.
A narrativa é baseada em uma história real, na qual Mary Cecilia
Rogers foi assassinada em Nova York. Edgar Allan Poe transfere todo esse
ambiente da cidade estadunidense para Paris, inclusive os jornais que
publicaram matérias a respeito do caso, com nomes parecidos com os
originais, mas em língua francesa.
O narrador sem nome, que relata as proezas do
amigo, apresenta várias vozes - população, jornalistas, policiais - para
mostrar como a de Dupin destoa de todas elas. O intelectual, que exerce
a função de investigador apenas para sentir-se menos entediado, critica
o sensacionalismo superficial dos jornais: "O perioódico que adota
opiniões triviais (não importa o quão bem fundamentada seja a opinião)
não conquista nenhum respeito com o povo. As massas consideram somente
aquele que sugere contradições pungentes à ideia geral."
Dupin analisa todas as probabilidades baseado em evidências da
anatomia humana e da física, dissecando e identificando notícias de
jornal que soam falsas e manipuladoras, revelando-se um leitor de
apurado e raro senso crítico. O chevalier dá uma aula de investigação criminal, na qual todas as evidências são consideradas.
Nota-se uma fusão entre jornalismo e literatura. A opinião pública
também é levada em conta, já que é dotada de pontos de vista baseados
nos rastros de violência que assolam a cidade. P. D. James, em sua obra
citada anteriormente, coloca "O mistério de Marie Rogêt" como o exemplo
pioneiro de investigação de gabinete, no qual "o detetive resolve o
crime a partir de recortes de jornal e reportagens". Essa cena é
recorrente em filmes e séries policiais, nos quais uma teia de fotos e
notícias é montada para chegar aos criminosos.
A mente de C. Auguste Dupin apresenta-se como algo similar a isso:
linhas imaginárias que se entrecruzam e encontram uma complexa e
improvável solução final.
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