Texto publicado no site Contraversão, em 04/12/2012.
Já consagrado como um dos grandes escritores da Literatura Brasileira Contemporânea, Rubem Fonseca é um habilidoso autor do gênero narrativo, tendo publicado volumes de contos como "O cobrador" e "Feliz ano novo", e romances consagrados como "A grande arte" e "Agosto" (o primeiro ganhou adaptação para o cinema e o segundo virou uma série exibida pela Rede Globo em 1993).
Considerado como pertencente a uma corrente brutalista de fazer literatura, a violência acaba por ser um tema recorrente em suas obras. E, como aparenta ser assíduo leitor de figuras batidas da narrativa policial (como Raymond Chandler e James Ellroy), Fonseca escreve com recorrente maestria dentro desse gênero (nos contos Romance negro e Mandrake, faz verdadeiras homenagns a essa vertente). Em “O Seminarista” não é diferente.
Em formato de memórias, José, matador de aluguel conhecido
como o Especialista e ex-seminarista, narra os eventos que se
sucederam quando resolveu abandonar a profissão de assassino particular.
Tal ofício nunca lhe causou nenhum tipo de ressentimento. Matar é o seu
trabalho, assim como o do padeiro é fazer pães. E como em qualquer outra
profissão, os sanguinários serviços fazem parte de sua rotina. Sua
decisão de aposentar-se é breve e sucintamente explicada: “Dentro de
mim sentia certo mal-estar, creio que estava começando a ficar foruxo, e
para um matador profissional a pior coisa do mundo é ter consciência,
não existem coisas erradas e coisas certas, é tudo a mesma merda.”
O problema é que, mesmo considerando sua profissão tão natural quanto
o ato de respirar, ele descobre não ser fácil abandonar um passado tão
sanguinário e violento. Uma rede de intrigas, guiada por diversas
personagens que entram na vida do agora ex-matador, conduz a uma
história repleta de mistério, reviravoltas, traições e vingança. José
passa a ser vítima de uma perseguição, não podendo confiar em pessoas
que considerava como seus (raros) amigos.
Assim como os romances policiais ambientados na proibida cidade de
Los Angeles estão repletos de chantageadores e impostores que retratam o
lado noir da cidade, são apresentadas personagens peculiares à
violenta Cidade Maravilhosa. Homens inescrupulosos e corruptos são
personalizados na figura perigosa de sujeitos como Sangue de Boi, D. S. e
Despachante, indivíduos que fizeram parte do passado de José e que
passaram a ser os principais suspeitos que o querem morto. A pergunta é:
qual deles, que já foram seus amigos, está por trás dessa mortífera e
psicológica emboscada?
Através de uma veloz e empolgante narrativa policial, o autor faz o
leitor sentir-se em um verdadeiro filme de ação, tamanha a habilidade e
fluidez com que os acontecimentos são desvendados. José e Kirsten, sua femme fatale às
avessas, lutam contra um inimigo de mão invisível, que os persegue de
maneira implacável. E ele se dá conta de que ser matador está no seu
gene: “existem dois grupos de pessoas que sobrevivem no mundo: os
que engolem sapos e os que matam sapos. Ou você engole ou você mata. Nós
matamos.”
Outro ponto forte do livro são as descrições das armas utilizadas
pelo Especialista. Através do seu narrador, Fonseca dá detalhes de
vários modelos e tamanhos de um armamento pesado (como a austríaca
Glock, preferida do protagonista). Assim como as descrições das cenas
(sim, chamo de cenas, tamanha é a perfeição com que tudo é narrado), que
são um show à parte. Apesar da velocidade desenfreada com que os fatos
são narrados, Rubem Fonseca apresenta detalhes que estruturam um verdadeiro filme na cabeça do leitor.
Emboscadas, vingança, suborno, fraudes, investigações. Esses são apenas alguns dos elementos que compõem “O Seminarista”.
Uma obra que, tal como uma Glock 9 mm, possui uma terrível e
maravilhosa simetria. Indispensável para os amantes de um bom romance
policial.
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