Aquilo já estava o irritando. Todo mundo falando daquela merda, como se nada antes daquilo houvesse existido. Não havia escapatória. Quando ligava o computador e acessava seus jornais favoritos, a manchete em destaque era sempre aquela. Nas redes sociais, então, nem se fala. As pessoas gostam de mostrar o quanto são medíocres quando uma nova febre desponta em seus medíocres e malditos cotidianos.
Desligou o computador. Uma caminhada talvez o ajudaria. Saiu para a calçada, sentindo os implacáveis e infernais raios solares virem de encontro à sua cabeleira. Antes de chegar à esquina já sentia as gotas de suor escorrerem por seu couro cabeludo até chegarem à sua nuca, seu pescoço, seu rosto. Duas pessoas, adolescentes, andavam com vagar a sua frente. Diferentemente do ritmo de seus passos, a conversa fluia com peculiar entusiasmo. O assunto: aquele. Davam opiniões. Um acreditava , outro não, um achava isto, o outro aquilo.
Isso, somado ao calor infernal e às gotas de suor que haviam se transformado em jorros que encharcavam sua camiseta, começou por irritá-lo. Achou que uma cerveja seria um bom remédio. Parou num bar. Pediu a cerveja, que lhe foi colocada à sua frente, com um copo do tipo americano ao lado da garrafa. Sabia que ali, naquele balcão repleto de boêmios, o assunto não seria abordado. Deu um gole naquele saboroso líquido gelado. Seu humor começara a melhorar. Quando achava que seu dia estava a salvo, eis que entra outro freguês, pede uma dose e inicia uma conversa com o dono do bar. O tema? Aquele.
Ele não podia acreditar. Pagou e saiu dali sem terminar a garrafa. Foi direto pra casa, trancou-se em seu quarto, isolou-se do mundo. Só queria que aquela data chegasse, passasse logo e que as pessoas voltassem a falar sobre futebol, política, religião e outras futilidades, como sempre faziam. Pensou se aquele absurdo realmente acontecesse. Visualizou os ateus, aqueles que sempre se mostraram destemidos, ingratos pela boa vida que têm, sendo os primeiros a clamar por um deus que sempre desafiaram apenas para se mostrarem polêmicos. Imaginou como se mostrariam na verdade uns idiotas, uns cagões, uns bundões, uns frouxos.
O dia chegou. Afora o calor insuportável, fruto das violentas investidas do homem contra a natureza, tudo estava normal. As pessoas foram trabalhar, ligaram sua televisão, falaram mal da vida alheia, roubaram, mataram, trapacearam, comeram, sujaram, cagaram. A terra não explodiu. Nenhum planeta colidiu com ela. Não houve chuva de meteoros ou água. Ele ligou seu computador. Os assuntos nos jornais e redes sociais já eram outros. Um político que roubou, foi condenado, mas não pode ser preso. Uma jovem vítima de bala perdida teve um funeral com caixão fechado, pois já não havia cabeça acima de seu pescoço. Uma passagem de ônibus que terá novo e absurdo aumento. Um país assolado pela fome em plena guerra civil. Um jornal de respeito preocupado com o fato de uma atriz ter parado de seguir um galã de Hollywood em uma rede social.
Ele elevou sua xícara de café fresco até seus lábios e deu um gole. O café estava particularmente bom naquela manhã. Coçou a cabeça. Olhou para o nada. Pensou. Respirou. Perguntou-se: será que o mundo não acabou de fato?
fica a dúvida...
ResponderExcluirme faço a mesma pergunta.
ResponderExcluirDesde o começo da vida, que o mundo tá acabando. Um dia é bem provável que acabará, afinal, tudo acaba. Quando criança ouvia que a CSN iria explodir acabando com Volta Redonda num determinado dia, e que já passou. Feliz Natal. http://grandeonda.blogspot.com
ResponderExcluirParanoia delirante!
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