quinta-feira, 30 de maio de 2013

Ficçãozinha VI

Enfim, era chegada a hora. Depois de muito tempo se encaravam para esse tão esperado duelo. Frente a frente, olho por olho, dente por dente. Ele tentava controlar a ansiedade o melhor que podia, pois o ódio que sentia pelo seu adversário era um sentimento enraizado, crônico, petrificado, algo que talvez nem a morte de seu inimigo poderia eliminar.

Estavam devidamente posicionados. Ambos tomando a mesma distância entre as pernas. Ambos com as armas colocadas no lado direito do cinturão. Ambos com uma Smith and Wesson calibre 38. Ambos com os dentes a ranger. Combinaram um duelo de tiro único, como nos velhos e perdidos tempos. Escolheram aquele pequeno saloon abandonado, localizado naquela minúscula cidade fantasma para que não fossem perturbados. 

Apesar de ter muita coisa para vociferar contra aquele que está a sua frente, ele se mantém em silêncio, assim como seu oponente. Se fosse dizer o que pensava, falaria sem parar por um ano inteiro. Durante toda a sua vida fora atrapalhado por seu contendedor. Todas as vezes em que pensou estar perto de obter algum tipo de êxito, ele o atrapalhou. Todos os seus romances foram arruinados por ele, que arrumava um jeito de afastar as donzelas que cortejava. Por isso, hoje eles se encontravam sozinhos, vítimas um do outro, víboras traiçoeiras que são.

Olhou o rosto de seu rival. Estava mais velho, com o rosto marcado por uma vida de sofrimentos físicos e, principalmente, psicológicos. Apesar do chapéu, conseguia notar os cabelos desgrenhados e brancos, revelando o desleixo daquele que costumava ser tido como um galã. A postura curvada, as mãos trêmulas, o fio de saliva que escorria pelo canto da boca, a camisa surrada, as calças rotas, as botas esburacadas. Era um alvo fácil. Não aparentava ser possuidor da menor agilidade no gatilho.

Preparou-se para o ataque. Seu oponente também. Ouvia-se apenas o barulho do vento que arrastava rolos de feno e espalhava a poeira do lado de fora. A porta do estabelecimento depredado rangia. Encostaram as mãos no cabo de seus cuspidores de fogo. Franziram o cenho. Era o sinal. 

Sacaram os revólveres. Engatilharam. Puxaram os gatilhos.

O ruído do disparo ecoou pela única  rua daquela pequena cidade abandonada. Ele olhou para frente, com o objetivo de conferir se o corpo de seu oponente jazia no chão. O que viu foi a imagem de seu inimigo despedaçada. 

Centenas de estilhaços, que pertenciam ao velho e manchado espelho, anteriormente pendurado na parede, estavam espalhados pelo chão.

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