Para quem gosta de literatura e já tentou se arriscar no território sombrio e traiçoeiro da escrita, há aquela curiosidade em saber como escrever um conto, romance ou poema de qualidades inquestionáveis. Existe uma fórmula para isso? Deve-se estudar algum tipo de teoria para que se desenvolva a capacidade para tal? Conversas com escritores que já exercem esse ofício há um certo tempo abrem caminhos desconhecidos em nossas mentes bloqueadas?
Como graduando do terceiro ano de Letras e leitor desde muito pequeno, que sonha em tirar seu sustento da escrita, sei que é muito difícil encontrar alguma voz que seja a força motriz dos textos que escrevo, ainda mais se esses escritos tenham intenções fictícias ou literárias. Leio regularmente blogs de alguns escritores e após ler o texto
"Literatura se faz na universidade?", da autoria de Carol Bensimon (formada em Publicidade e Propaganda), essa questão da fórmula de escrever voltou a habitar minha mente.
Não quero falar aqui em dom, dádiva que representa um autodidatismo obscuro e difícil de ser decifrado. Semana passada, em uma aula de Psicologia da Educação, muito foi discutido a cerca de capacidade, função que é desenvolvida conforme a repetição de certos hábitos. A assiduidade desses tornaria algumas ações mecânicas, automáticas. Confesso que, mesmo escrevendo regularmente há vários anos, ainda não consegui atingir esse nível de maturidade. Um simples texto como esse ainda é uma operação bastante laboriosa, truncada, como bater com uma talhadeira em pedra de mármore.
Na universidade, conhecemos as teorias dos mais diferentes estudiosos de narrativa e poesia. Estudamos e nos utilizamos de metodologias criadas por teóricos como Gérard Genette, Tzvedan Todorov e Vladimir Propp, que nomearam com termos técnicos (como analepse e prolepse, para retrocessos e avanços temporais, respectivamente) e estruturaram a composição de narrativas em etapas fixas, para analisarmos e dissertarmos sobre obras literárias. Um escritor dificilmente, como a própria Bensimon relata em seu texto, prenderia-se a essas teorias para ar qualidade à sua obra.
Na cidade onde moro há um curso para formação de criadores literários. Tenho um amigo que frequenta essas aulas e diz serem muito boas. Antes de haver esse curso, já havia lido alguns contos desse amigo, que eram muito bons. Isso me faz pensar que ele já tinha uma pré-disposição para a escrita. As aulas só estão servindo para aparar algumas arestas. Ouço dizer que alguns alunos apresentaram melhoras expressivas durante esse período de aprendizagem, em comparação ao modo como escreviam antes de matricularem-se nessas aulas.
Hoje não há um curso que forme, de fato, escritores. Todos conseguirão o diploma do curso acima citado, mas quem garante que seguirão essa profissão à qual se propuseram? Será que deveria haver, nas próprias universidades, uma grade de ensino que fosse totalmente voltada para o desenvolvimento da capacidade narrativa ou poética de cada indivíduo?
Penso que haja os dois lados. O bom seria a capacitação, mesmo que de forma amadora, de pessoas que gostam e querem aumentar suas aptidões para escrever histórias fictícias. O ruim talvez fosse a mecanização de um processo que, embora deva contar com uma grande parcela de consciência do que se está fazendo, é feito com base em algo que está inserido na sensibilidade dos maiores escritores da literatura universal, um segredo que só as maiores mentes literárias possuem. Se essa fórmula pudesse ser ensinada ou vendida, aí a literatura certamente não seria uma das formas de arte mais complexas e fascinantes do mundo.
Mesmo que eu não descubra esse misterioso caminho poético, prefiro que ele seja mantido como está, bem escondido aos olhos dos que apenas leem e se encantam. Pelo bem da literatura.